Por Eduardo Pessine

A passagem da “boiada” para a privatização do saneamento básico expôs uma dura realidade ao povo brasileiro: não existe oposição real no Brasil contra o desmonte do estado nacional!
Nesta semana, foi aprovado o PL 4.162/19, que modifica o Marco Legal do Saneamento e abre as portas para a privatização do setor de saneamento e até mesmo da própria água, um recurso natural absolutamente estratégico para o desenvolvimento de qualquer nação. Apesar do projeto de lei em si não privatizar diretamente o serviço de saneamento básico e a água, ele permite a participação de empresas privadas em licitações municipais no processo de concessão às empresas estaduais, o que não ocorria antes – a empresa estadual anteriormente assumia a concessão diretamente, sem licitação. Em outras palavras, esse projeto de lei abre caminho para que empresas estrangeiras, estatais ou privadas, assumam o serviço de saneamento de grandes cidades, lucrativas, deixando as pequenas cidades deficitárias nas mãos das estatais, o que certamente as levarão à falência.
Além disso, a própria instalação das empresas estrangeiras no país já gera uma enorme ameaça para qualquer projeto de desenvolvimento nacional. A presença econômica de lobbies estrangeiros aumenta muito o poder de influência destes grupos na política nacional e nos rumos do país.
O projeto passou de lavada no Senado – como dizem por aí, à esquerda e à direita, “as instituições funcionam normalmente” – escancarando que a aposta na oposição parlamentar é uma profunda ilusão e levará o Brasil ao fundo do poço. As instituições políticas brasileiras estão apodrecidas e precisam de uma renovação dentro do marco de um movimento de libertação nacional. Entretanto, nem mesmo a suposta oposição atua em favor dos interesses nacionais: PDT, PSB e REDE, que compõem o “frentão”, votaram todos a favor do projeto, enquanto o PT, com sua bancada de seis senadores, nada fez contra a aprovação do projeto para além do voto, com o líder do partido, o senador Rogério Carvalho, afirmando inclusive, “Não me oponho ao investimento privado na área de saneamento. Acho que o investimento público e o investimento privado precisam acontecer simultaneamente, não há dogmatismo da nossa bancada em relação a esse tema”.
Cid Gomes foi outro que “costeou o alambrado”, votando a favor do projeto e mostrando que o “nacionalismo” do clã Ferreira Gomes mais ladra do que morde. No caso de Cid, morde o bolsonarismo, mas só ladra para Paulo Guedes e os interesses estrangeiros. Seu irmão, Ciro Gomes, publicou um vídeo atrapalhado com seu colega do mercado financeiro, Eduardo Moreira, onde afirma até mesmo que ainda estava “começando a entender o que foi votado”. Há quem diria que para quem defende um projeto nacional de desenvolvimento, os rumos da água e do saneamento nacional deveriam estar na ponta da língua! Mas o “nacionalismo” de goela tem seus limites: fica de lado quando se trata de um projeto do padrinho político – e multimilionário – Tasso Jereissati.

No vai-e-vem do teatro parlamentar, a aprovação do projeto alimentou a cretina “disputa” entre PDT e PT, ou mais precisamente, entre Ciro Gomes e PT. Mas o fato é: a “oposição” como um todo, ambos os lados dessa falsa disputa, contribuíram para a aprovação do projeto – até mesmo aqueles que deram seu inútil voto “não”, na causa perdida – merecendo até mesmo agradecimentos especiais à bancada do PT por parte do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, por ter removido os destaques e permitido uma votação rápida no plenário.
Essa derrota da nação brasileira – dentre muitas – deixa às claras que o povo brasileiro está completamente excluído da política nacional e da decisão dos rumos do país. A suposta oposição está acertada com interesses espúrios em troca da manutenção dos mandatos e do teatro parlamentar, encenado nas apodrecidas instituições da República Rentista.
A iminente queda de Bolsonaro, quando for consumada, significará, na prática, a ascensão ao poder deste mesmo consórcio político que escancarou a porta do saneamento básico nacional às empresas estrangeiras. O “fora Bolsonaro” não significa, nem significará assim, o “fora Guedes”. A destruição nacional e a dilapidação do patrimônio público brasileiro continuará com ou sem Bolsonaro, e a dura realidade é que, atualmente, não existem forças políticas comprometidas com a retomada da soberania popular em nosso país. Os partidos tradicionais, em grande parte, fazem vista grossa ao rentismo e estão mergulhados no cretinismo parlamentar. Essa práxis política significará a perpetuação de nossa condição de colônia.
Para reconstruir a indústria nacional, a geração de empregos, o desenvolvimento e a soberania tecnológica, retomar o patrimônio que nos foi roubado, como a Embraer, braços da Petrobrás e agora nossa água, é necessário romper definitivamente com o rentismo e adotar uma postura política radical, sem ilusões. E infelizmente, ao que tudo indica, o povo brasileiro não terá como aliados nesta luta nem Ciro Gomes, nem o Partido dos Trabalhadores.
A vitória somente virá do próprio povo, organizado em torno de uma luta de libertação nacional!